O partido Novo tenta reverter a suspensão do X (antigo Twitter) com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) que teve a relatoria sorteada para o ministro Nunes Marques.
A sigla contesta a decisão do ministro Alexandre de Moraes, que mandou suspender a plataforma em todo o país. O argumento é de que a ordem feriu princípios fundamentais como o direito à liberdade de expressão, o devido processo legal e a proporcionalidade.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também acionou o STF sobre o tema. A entidade questiona especificamente a multa de R$ 50 mil para quem burlar o bloqueio do X usando meios tecnológicos, como o VPN.
Essa ação também está com Nunes Marques.
Não há precedente na Corte de derrubada de decisão de um ministro do STF por meio de decisão individual de outro ministro do Supremo no tipo ação escolhida pelo Novo e pela OAB: a chamada arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF).
Essa ação é usada para evitar ou reparar lesão a direitos e garantias fundamentais resultantes de ato do Poder Público. Em geral, o instrumento é destinado a questões abstratas e gerais – e não a casos concretos específicos.
Este é um primeiro obstáculo para o andamento da ação do Novo. O partido questionou diretamente a decisão de Moraes de mandar suspender o X no Brasil.
Em um complemento à ação, apresentado depois, a sigla passou incluir a decisão da primeira turma, que confirmou as medidas contra o X.
Outra particularidade do caso é o fato de se questionar decisão de um integrante do próprio STF.
A jurisprudência consolidada da Corte é de que não cabe habeas corpus contra decisão individual de ministro ou de órgão colegiado, como as turmas. Mesmo a derrubada de decisão individual de ministro por meio de outros tipos de ações é considerada uma medida excepcional.
Um caso recente foi em 2020, quando o então presidente do STF Luiz Fux suspendeu a liminar (decisão provisória) dada pelo ministro Marco Aurélio que determinou a soltura do traficante André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap.
Ocorre que a primeira turma confirmou a decisão de Moraes. Ou seja, cinco ministros da Corte entenderam que não houve inconstitucionalidade na decisão, e a referendaram.
Segundo afirmou a OAB em sua ação, o processo foi movido diante da ausência de outro instrumento ou recurso viável para contestar a decisão da primeira turma e levar a discussão para o plenário.
“Impõe-se reconhecer que a ADPF constitui o único meio de fiscalização constitucional capaz de responder ‘de forma ampla, geral e imediata’ às violações caracterizadas pelo ato impugnado”, disse a entidade.
Liminar urgente e plenário
A lei que regula o processo e julgamento da ADPF só estabelece a possibilidade de uma decisão liminar (provisória) pelo relator em caso de “extrema urgência ou perigo de lesão grave” e determina que a ordem seja encaminhada para análise do plenário.
Outro ponto da lei dispõe que o pedido via ADPF não será aceito “quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade”.
Conforme mostrou a CNN, Nunes Marques ainda analisa os próximos passos na ação: por exemplo, se irá submeter o caso ao plenário. Para uma ala da Corte, diante da complexidade do caso, um julgamento pelos 11 ministros da Corte seria o melhor cenário.
Mesmo o eventual envio do caso ao plenário poderá trazer custos. Como a maioria do Supremo tende a endossar as decisões de Moraes, submeter o processo ao plenário poderia não só escancarar um eventual isolamento de Nunes Marques e André Mendonça, mas desgastar ainda mais o tribunal em meio à escalada da crise com o X.
Indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Nunes e Mendonça costumam divergir de alguns posicionamentos de Moraes.
Precedente
Moraes já teve suas decisões questionadas no STF por meio de uma ADPFs apresentadas pelo Progressista. Em uma delas, o pedido foi negado pela ministra Cármen Lúcia.
A sigla questionou o ato de Moraes de abrir a investigação sobre a venda das joias sauditas, que implica o ex-presidente Jair Bolsonaro e ex-assessores.
A magistrada rejeitou o andamento da ação por entender que a ADPF não era cabível naquele caso.
Conforme a ministra, a ADPF é um mecanismo de controle abstrato (não devendo ser usado para situações concretas) e não pode ser apresentada como uma espécie de recurso contra decisão judicial.
“Nem o objeto exposto na peça inicial – decisão judicial em caso específico e ainda sub judice – poderia ser questionado em arguição de descumprimento de preceito fundamental, instrumento de controle abstrato; nem é a arguição de descumprimento de preceito fundamental sucedâneo recursal como pretendido em caso concreto submetido à jurisdição; nem se tem atendido, no caso, o princípio da subsidiariedade”, afirmou a ministra, na decisão, de março deste ano.
Perda de objeto
Para o advogado e professor de Direito Constitucional Henderson Fürst, a ação apresentada pelo Novo “perdeu o objeto”, ou seja, o alvo questionado (decisão de Moraes) já foi confirmado pela primeira turma.
“A decisão que temos hoje em dia [de suspensão do X] não é mais do ministro Moraes. Nós temos uma decisão que é unanimidade da primeira turma. Tenho a impressão de que já teria perdido o objeto a ADPF, por ataca uma decisão monocrática já referendada pela turma”, afirmou.
O especialista também disse que existe a modalidade de questionar decisão judicial pela modalidade de ADPF conhecida como “incidental”. Ocorre que não há definição sobre se é possível mover essa ação contra decisão de ministro do STF.
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